Recordamos aos Irmãos, bem como aos profanos interessados, que qualquer estudo sobre Maçonaria dirigido ao público externo deve conter somente informações de caráter geral — aquelas que já se encontram nos livros introdutórios de história, simbologia e filosofia maçônica. Os ensinamentos considerados reservados, transmitidos exclusivamente em Loja e nos momentos apropriados, permanecem restritos aos Iniciados da Ordem.
Portanto, tudo o que será exposto aqui está rigorosamente dentro dos limites do sigilo maçônico e tem como propósito maior promover o aperfeiçoamento ético, intelectual e espiritual daqueles que desejam beber dessa fonte de Luz que é a nossa Sublime Ordem Maçônica.

O 19º Grau do Rito Escocês Antigo e Aceito (REAA), denominado Grande Pontífice ou Sublime Escocês, inaugura um novo ciclo na jornada iniciática do Maçom, sendo o primeiro dos graus denominados Kadosh, que se estendem até o 30º. Este grau representa uma transição significativa da Maçonaria simbólica e inefável para a Maçonaria filosófica e esotérica em sua plenitude. Profundamente imerso em simbolismos gnósticos, cabalísticos e cristãos, o Grau 19 é, ao mesmo tempo, uma reafirmação da fé, uma renovação do compromisso moral e um convite à construção espiritual do homem como ponte viva entre o visível e o invisível.

Origem Histórica e Etimológica: O Fazedor de Pontes
A origem do título “Pontífice” remonta à Roma Antiga, cinco séculos antes da Era Vulgar. Naquele tempo, formou-se um colégio de homens que acumulavam os ofícios de soldados e carpinteiros e que receberam o encargo de custodiar e manter as pontes da cidade. Eram os “Pontifices”, do latim pontem facio, “o que faz pontes”, em referência tanto à ligação física quanto à espiritual. Posteriormente, o título foi conferido a Júlio César em 63 a.C. como Sumo Pontífice e, ao final do século III, passou à figura do Papa, o “Bispo de Roma”, como ponte espiritual entre os fiéis e a divindade.
Esse simbolismo de ponte é fundamental neste grau. O iniciado é chamado a ser um ligador de mundos, um construtor de passagens entre os domínios profanos e sagrados, entre o homem e o Absoluto, entre a ignorância e a sabedoria. Ser Grande Pontífice é tornar-se um arquiteto da alma e um engenheiro do espírito.
O Templo do Grau 19 e a Jerusalém Celeste
O Grau se desenvolve num Templo azul salpicado de estrelas douradas, representando a abóbada celeste, sob uma grande luz que irradia de um anteparo transparente acima do Trono do presidente, que recebe o título de Três Vezes Poderoso Mestre. À sua frente, estão colocadas as Constituições Maçônicas de 1762 e 1786, os Regulamentos e Estatutos do Supremo Conselho, simbolizando a ordem jurídica e espiritual do Rito.
No centro do Templo, ergue-se uma montanha ritualística, símbolo da ascensão iniciática, com um precipício que impede a descida direta rumo ao Oriente, obrigando o iniciado a buscar o caminho mais árduo: o do esforço, do mérito e da elevação pessoal. Defronte ao Mestre de Cerimônias vê-se uma tela representando uma cidade quadrada com três portas em cada lado e uma árvore central que dá doze frutos diferentes: é a imagem da Jerusalém Celeste, como descrita no Livro do Apocalipse.
A Joia e as Insígnias do Grau


A joia do grau é uma medalha dourada em forma quadrilonga, pendente de uma faixa carmesim com debrum branco, simbolizando o místico e o cósmico. No centro da joia estão gravadas as letras alfa e ômega, os princípios e fins de todas as coisas, símbolo da completude espiritual. Alinhadas verticalmente, encontram-se doze estrelas douradas, representando:
- Os doze Anjos das portas da Jerusalém Celeste;
- As doze tribos de Israel;
- Os doze trabalhos de Hércules;
- As doze virtudes que o iniciado deve assimilar;
- E os doze princípios filosóficos fundamentais que regem o Grau 19.
O Ritual de Iniciação ao Grau 19 e as Três Viagens
O candidato, já portador do 18º grau Rosa-Cruz, é reconhecido como aquele que lutou contra a intolerância e a opressão, armado da fé, da esperança, da caridade e da paciência. É convidado a aceitar a tríplice coroa da fidelidade, da verdade e da razão e para tanto, ele deve realizar três viagens iniciáticas, cada uma repleta de profundos ensinamentos morais e simbólicos.
Primeira Viagem: A Montanha e o Precipício
Nesta jornada, o iniciado sobe a montanha ritual até um precipício, onde abandona simbolicamente as superstições, da arrogância e da vaidade. Com os olhos vendados, ele renuncia ao mundo profano e é libertado da ilusão. Ao lançar a venda e os paramentos antigos no abismo, assume a luz da razão como seu novo guia.
Segunda Viagem: As Doze Estrelas, as Doze Verdades Fundamentais
O iniciado entra em contato com doze verdades filosóficas, representadas pelas doze estrelas do grau:
- A primeira das estrelas significa que não há princípio de virtude, de honra, ou de moral, que não seja inerente à Consciência, e que todo homem de juízo perfeito e mediana educação, não possui no mesmo grau que o mais instruído
- A segunda, que nenhum desses princípios, nem mesmo todos juntos, bastam para governar a Associação, porque e bem que se faz aos homens, pele sentimento moral, é passageiro e só produz efeitos transitórios, enquanto que a necessidade humana é uma vasta oficina de trabalho e produção, na qual o interesse material é mais poderosa que o moral.
- A terceira, que as religiões, filhas do grau de civilização que cada povo alcança, não podem servir para regê-lo, pois todas se apóiam no Absoluto, e, se invadirem o terreno intelectual, o dominam, paralisam a Razão e sepultam o universo no obscurantismo.
- A quarta, que a Metafísica e a Psicologia, ocupadas só no abstrato, perdem-se em vãs especulações ou caem no Absoluto, pelo que nunca fizeram progredir a civilização.
- A quinta, que a literatura não pode ser um modelo, de vez que abraça erros e verdades de uma época. Serviria, assim, para consagrar o Mal, com o prestígio da Antigüidade, ou o Bem, e este é tão limitado, que melhor auxilia a Educação que a Sabedoria.
- A sexta, que a conduta moral e intelectual do homem se amolda à época e pais, em que vive, cujas noções mudam em cada geração e, às vezes, em cada ano, se os sábios tiverem o caminho livre para proclamar suas idéias.
- A sétima, que, sendo as opiniões e instituições relativas ao lugar que os países ocupam no tempo, querer que idéias se sedimentem nos mais civilizados e se firmem neles, a não ser pelo decorrer dos séculos, é querer que desapareça o intervalo que separa a semeadura da produção do fruto.
- A oitava, que o Governo melhor é aquele que destrói as más leis de seus predecessores, quer por desatualizadas, quer por servirem a interesses particulares.
- A nona, que o Progresso é o resultado das leis fiscais, unidas às leis intelectuais.
- A décima, que separar uma da outra, é anulá-las reciprocamente.
- A décima primeira, que os bens do progresso científico se anulam com a corrupção dos costumes, que rompem os vínculos da família e implantam a desconfiança entre os associados, como os da moralidade em um país se desvanecem, quando caminha para o seu embrutecimento.
- Finalmente, a décima segunda, que não basta conhecer nossos deveres, nem promulgar nossos direitos, é necessário saber cumprir uns e garantir os outros.
Essas são as verdades, que, bem entendidas e observadas, vos levarão ao apogeu da Civilização. Enquanto o edifício social não descansar no progresso moral, unido ao intelectual, e enquanto o Templo o Templo da Razão não esmagar esse nefando réptil, essa hidra de três cabeças a Intolerância, a Superstição e o fanatismo -, que renasce sem cessar, não haverá paz na terra, nem a Justiça regerá nossos destinos
Terceira Viagem: A Ponte e a Unção Espiritual
Na sequência do caminho iniciático, o iniciado é conduzido à Terceira Viagem, uma etapa profundamente simbólica que representa a transição definitiva entre os mundos. Agora, ele se depara com uma ponte simbólica, cuja travessia marca o limiar entre o profano e o sagrado. Este momento não é apenas uma passagem: é um rito de transformação, um marco em que se abandona o passado e se abraça uma nova missão.
Ao atravessar essa ponte, o iniciado aproxima-se do quadro da Jerusalém Celeste, visão sublime do destino espiritual da alma. Ali, é perfumado com incenso, em um ritual que purifica e consagra. Nesse instante, o Três Vezes Poderoso Mestre o conclama solenemente: “Torna-te um verdadeiro Grande Pontífice”, um construtor de pontes entre a humanidade e a Sabedoria Suprema.
A ponte é um arquétipo universal presente em diversas tradições iniciáticas, místicas e filosóficas. Ela simboliza a ligação entre dois mundos opostos: o mundo profano e o mundo sagrado, a ignorância e o conhecimento, a matéria e o espírito. Ao atravessá-la, o iniciado deixa para trás suas limitações materiais, suas ilusões e suas paixões desordenadas. Ele ingressa, simbolicamente, em uma nova terra: a terra da Sabedoria, da Luz e da Verdade. Esta travessia não marca um ponto final, mas sim um novo início. É a passagem do aprendizado para a ação, da contemplação para a realização, da preparação para a responsabilidade.

A partir deste momento, o iniciado não é mais um simples buscador — é ele próprio um construtor de pontes. É significativo recordar que a palavra Pontífice deriva do latim Pontifex, que significa literalmente “construtor de pontes”. Este é o verdadeiro papel que o iniciado assume: mediar, unir, reconciliar.
Diante do quadro da Jerusalém Celeste, o iniciado contempla o símbolo do destino final da alma, a cidade espiritual perfeita. A Jerusalém Celeste representa a síntese das virtudes humanas e divinas, a realização da Grande Obra Maçônica e o ideal supremo de harmonia, paz e perfeição. Essa visão desperta no iniciado o chamado interior para trabalhar ativamente na construção, aqui e agora, de uma sociedade justa e harmoniosa, inspirada na Justiça, na Paz e na Verdade. Ele compreende que não basta vislumbrar a perfeição: é necessário empenhar-se em trazê-la ao mundo.
Neste momento solene, o iniciado é perfumado com incenso, em um rito de purificação e elevação espiritual. O uso do incenso, presente em quase todas as tradições religiosas, carrega significados profundos: torna o ambiente sagrado, eleva as preces e intenções aos céus e afasta as impurezas espirituais. Na Maçonaria, a unção com incenso é um ato de consagração pessoal, que marca o momento em que o iniciado está espiritualmente preparado para assumir uma missão maior. Este gesto simbólico purifica o passado, abre os caminhos espirituais e sela a consagração do iniciado como Grande Pontífice. É um rito que marca a maturidade espiritual e o compromisso com a missão filosófica e moral que se seguirá.
A voz do Três Vezes Poderoso Mestre ecoa como um chamado à vocação superior. Esse chamado transcende a formalidade ritualística. É um convite direto à responsabilidade espiritual. O iniciado não deve ser apenas um conhecedor de doutrinas, mas sim um agente ativo de transformação. A partir de agora, sua missão é ser um construtor de pontes: entre os homens e a Sabedoria Suprema, entre os diversos saberes e culturas, entre os conflitos humanos e a harmonia universal. O título de Grande Pontífice não é um privilégio — é um dever. Espera-se que o iniciado trabalhe pela reconciliação dos opostos, promova a harmonia entre razão e fé, entre ciência e espiritualidade, e sirva como elo entre o mundo visível e as verdades invisíveis.
A Terceira Viagem é a síntese de toda a trajetória anterior. É o momento em que o iniciado compreende, com clareza, que todo o conhecimento adquirido deve se transformar em prática, que toda a luz recebida deve ser compartilhada e que toda a elevação espiritual deve se refletir em ações concretas no mundo. O iniciado, que até aqui era um buscador, agora se torna um guia, um mediador, um verdadeiro mestre-construtor de pontes. Sua jornada se transforma em missão, e sua luz interior se torna um farol para aqueles que ainda atravessam o caminho.e transforma em um guia, um mediador, um mestre-construtor de pontes.
Simbolismo do Grau 19:
Hércules, Jesus, Dante: O Caminho do Herói

O simbolismo dos doze trabalhos de Hércules perpassa o grau como metáfora da jornada interior do iniciado. Assim como Hércules desceu aos infernos e venceu monstros, o Maçom é chamado a enfrentar seus próprios vícios e paixões, num combate interior que também foi realizado por Jesus no deserto e por Dante na Divina Comédia. Descer ao inferno simbólico, resgatar os que lá se encontram e retornar iluminado é a missão do verdadeiro iniciado.
As 12 Colunas Zodiacais
Doze também são as Colunas Zodicais, que estão presentes no Templo Maçônico e embora elas não estejam representados na Abóbada Celeste, por estarem representados na parte superior das 12 colunas das paredes Norte e Sul, devem ser referidos dentro do mesmo contexto.

Com a designação de Colunas Zodiacais, a sua disposição e significado simbólico é diferente nos hemisférios norte e sul. A disposição realizada corresponde a um templo situado no hemisfério norte e que passamos a descrever. Na parede Norte e no sentido do caminhar em Loja observamos a seguinte sequência: Áries, Touro,
Gêmeos, Câncer, Leão e Virgem. Na parede Sul: Libra, Escorpião, Sagitário, Capricórnio, Aquário e Peixes. Passamos agora através de uma tabela descrever a correspondência de cada signo, no hemisfério norte.

A Jerusalém Celeste: Ideal de Sociedade Perfeita
A Jerusalém Celeste não é apenas uma alegoria espiritual, mas uma utopia moral e social. Representa a construção de uma sociedade onde a razão, a virtude e a sabedoria regem os destinos humanos. Apenas os eleitos – aqueles que venceram a si mesmos – podem habitar essa cidade. É o arquétipo da Loja ideal, da humanidade regenerada, da Fraternidade Universal.
Influências do Apocalipse, Gnose e Cabala
O Livro do Apocalipse – ou Revelação – fornece a base simbólica do Grau 19. Seus elementos são transmutados em linguagem iniciática, associando-se à Tradição Gnóstica e à Cabala Hermética. A Árvore da Vida, a Cidade Celeste, os doze Anjos e os mistérios do fim dos tempos são reinterpretados como etapas da jornada de autoconhecimento e superação.
Um Chamado à Pureza Filosófica
O Grau 19 adverte contra o esvaziamento filosófico da Maçonaria, quando esta se transforma em um clube social ou uma arena política. A Maçonaria, para cumprir sua missão, deve ser uma sociedade de busca, estudo e iluminação, comprometida com a evolução moral e espiritual do ser humano. As Lojas devem ser escolas de Virtude, e não palcos de vaidades.
A Missão do Sublime Escocês
Ao concluir suas viagens e absorver os ensinamentos do grau, o iniciado assume uma nova identidade: ele se torna um obreiro da Razão, defensor da Justiça e buscador incansável da Verdade. Sua missão transcende os limites da Loja: é a edificação de um mundo mais justo, harmônico e sábio. Ele torna-se o verdadeiro Grande Pontífice, o que faz pontes – entre homens, entre ideias, entre mundos.
Conclusão: Um Marco Filosófico na Jornada Iniciática
O Grau 19 do Rito Escocês Antigo e Aceito é um dos mais densos e profundos da Maçonaria Filosófica. Nele, convergem simbolismos ancestrais, doutrinas iniciáticas, reflexões filosóficas e ideais sociais. O iniciado é chamado à transformação completa: abandonar o velho homem e renascer como sacerdote da razão, construtor da harmonia e guardião da ponte entre o visível e o invisível.
É nesse grau que o Maçom começa a compreender, em toda a sua plenitude, que a verdadeira Maçonaria é a construção do Templo Interior, a edificação da Cidade Perfeita, a realização espiritual do Ser.
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Na próxima publicação desta série, exploraremos juntos os segredos e ensinamentos dos Conselhos Filosóficos de Kadosh (19º ao 30º Grau), com 20º Grau, o Soberano Príncipe da Maçonaria ou Mestre Ad Vitam.
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